Sustentabilidade e políticas públicas de combate a despopulação rural no Brasil e Espanha: Reflexões necessárias
Autor | Cleide Calgaro/Ricardo Hermany |
Cargo del Autor | Pós-Doutora em Filosofia e em Direito ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS/Pós-Doutor na Universidade de Lisboa (2011) |
Páginas | 193-203 |
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SuStentabilidade e políticaS públicaS de combate a deSpopulação rural no braSil e
eSpanha: reflexõeS neceSSáriaS
CAPÍTULO X
SUSTENTABILIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE
A DESPOPULAÇÃO RURAL NO BRASIL E ESPANHA:
REFLEXÕES NECESSÁRIAS
Cleide Calgaro
1
Ricardo Hermany
2
PREMISSAS INTRODUTÓRIAS
Observa-se que a Espanha tem adotado uma série de medidas estratégicas
para a busca da sustentabilidade e algumas são apresentadas nesta seção. É
fundamental a busca do direito à sustentabilidade aos produtores agrícolas,
incluindo a gestão social, econômica e ambiental. Ressalta-se a gama de políti-
cas públicas utilizadas na Espanha e no Brasil, a m de garantir que haja uma
agricultura pautada na sustentabilidade. Nesse sentido, questiona-se: como o
direito à sustentabilidade e suas políticas públicas podem contribuir para o
combate a despopulação rural no Brasil e na Espanha?
O Quadro 1 apresenta a comparação dessas políticas, de acordo com Silva,
Lopéz e Constantino (2016).
1 Pós-Doutora em Filosoa e em Direito ambos pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul - PUCRS. Doutora em Ciências Sociais na Universidade do Vale do
Rio dos Sinos - UNISINOS. Doutora em Filosoa pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul - PUCRS. Doutora em Direito pela Universidade de Santa Cruz
do Sul – UNISC. Atualmente é Professora da Graduação e Pós-Graduação - Mestrado e
Doutorado - em Direito na Universidade de Caxias do Sul - UCS. É Líder do Grupo de
Pesquisa “Metamorfose Jurídica” vinculado a Universidade de Caxias do Sul-UCS. Orcid:
https://orcid.org/0000-0002-1840-9598. CV: http://lattes.cnpq.br/8547639191475261.
E-mail: ccalgaro1@hotmail.com
2 Pós-Doutor na Universidade de Lisboa (2011); Doutor em Direito pela Universidade do
Vale do Rio dos Sinos (2003) e Doutorado sanduíche pela Universidade de Lisboa (2003);
Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (1999); Professor da graduação
e do Programa de Pós-Graduação em Direito- Mestrado/Doutorado da Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC; Coordenador do grupo de estudos Gestão Local e Políticas
Públicas – UNISC. Lattes: . ORCID:
orcid.org/0000-0002-8520-9430>. Consultor Jurídico da Confederação Nacional de
Municípios – CNM. E-mail: .
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Cleide Calgaro/riCardo Hermany
Quadro 1 – Comparativo de políticas públicas no Brasil e Espanha
Fonte: SILVA; LOPÉZ; CONSTANTINO, 2016, p. 277.
Com base no Quadro 1, observa-se uma série de políticas públicas adotadas
pelos dois países no intuito de proteger a agricultura familiar e buscar a coo-
peração dos agricultores, para que haja uma produção ecológica consciente e
direcionada para a sustentabilidade, tendo como fundamento o espaço local.
Existem convergências e divergências entre as políticas públicas do Brasil e
da Espanha, entretanto, o Brasil tem possibilidades de avanço e crescimento,
por meio de investimentos para que verique suas falhas e possa buscar ar-
ranjos produtivos. A Espanha, por sua vez, pode adotar medidas que visem
à redução do despovoamento na área rural, as quais vão desde incentivos até
políticas públicas de permanência nesses espaços locais.
O desenvolvimento rural se faz com a participação e o exercício da cida-
dania na elaboração, na gestão e no planejamento de políticas públicas locais,
o que permite que se concretize a democracia e o direito à sustentabilidade.
A sustentabilidade precisa estar baseada nos princípios sociais, ambientais,
econômicos, políticos, culturais, tecnológicos, cooperativos, entre outros, para
que se possa ter um desenvolvimento da agricultura familiar e da agroin-
dústria, e estar pautada no acesso a crédito, a terra, à tecnologia, permitindo
que todos os atores sociais possam participar, empoderando-se e se sentindo
pertencentes àquele espaço local.
Desse modo, visando responder ao problema da pesquisa utiliza-se o mé-
todo de abordagem dedutivo, partindo-se de dados gerais - premissa maior
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- para dados especícos - premissa menor. Além disso, adota-se o método de
procedimento hermenêutico, visto que possibilita a correta interpretação dos
textos, tornando-se relevante para a correta crítica da realidade brasileira e es-
panhola. A técnica de pesquisa é a bibliográca, voltando-se para a análise de
documentações indiretas, analisando os contornos e fundamentos da legisla-
ção, além de utilizar diversas obras, livros, artigos, monograas, dissertações,
teses, que dispõem sobre as temáticas.
A pesquisa divide-se em dois objetivos especícos, sendo que o primeiro
aborda a sustentabilidade agrícola em suas múltiplas dimensões, traçando
um paralelo com a experiência espanhola. E o segundo objetivo é vericar os
desaos e perspectivas das políticas rurais no contexto brasileiro.
1. SUSTENTABILIDADE AGRÍCOLA EM SUAS MÚLTIPLAS
DIMENSÕES E A EXPERIÊNCIA ESPANHOLA
Importante alternativa a ser analisada na perspectiva da múltipla susten-
tabilidade é o turismo rural - no caso da Espanha, o que pode ser igualmente
fortalecido no Brasil - o qual poderia ser um caminho para criar políticas pú-
blicas
3
que minimizem o problema da despopulação rural. Para Santos (2018,
p. 87), o turismo rural surgiu ocialmente a partir de 1990, com a política de
diversicação da oferta turística galega. Arma o autor que, [s]egundo Spar-
rer
4
(2005) essa mesma autora, em 1995 criou-se a primeira normativa que
rege sobre o turismo rural na Galícia. Neste documento se especica sobre a
denominação dos estabelecimentos de turismo rural. Os objetivos dessa nor-
mativa seriam contribuir para a criação de infraestruturas em núcleos rurais a
partir do aproveitamento de sua riqueza histórico cultural e, igualmente, pos-
sibilitando a reabilitação e conservação desses lugares, além de colaborar para
a criação de emprego e xação da população rural (SANTOS, 2018, p. 87).
No ano de 2011, essa normativa foi revisada e se estabeleceu a Lei nº 7, de
27 de outubro, a qual estabelece as diretrizes do turismo rural. Contudo, se
houver casos omissos, utiliza-se a Ordem de 2 de janeiro de 1995 (JUNTA
DE GALÍCIA, 2017). Essa lei
5
enumera 55 artigos sobre os tipos de estabe-
3 Para Gastal e Moesch, “a democratização das políticas de turismo deveria ser pautada
em: “a) ter normatizações jurídicas; b) realizar intervenções diretas na forma de linhas de
nanciamento, implantação de infraestrutura, gerenciamento de informações, treinamen-
to e qualicação de recursos humanos, com a lógica da proteção a grupos e comunidades
frágeis quer por razões econômicas, quer por razões culturais; c) consolidar diretrizes
políticas que não intervém apenas o turismo nos seus desdobramentos econômicos, mas
também nas suas implicações socioculturais centradas na pessoa, ou seja, no turista”
(GASTAL; MOESCH, 2007, p. 42).
4 Consultar em: SPARRER, M. El turismo en espacio rural como una estrategia de desarrollo. Una
comparación a nivel europeo. 2005. 763f. Tese (Doutorado em Geograa) - Universidade de
Santiago de Compostela, Faculdade de Geogara e História, Departamento de Geograa.
Santiago de Compostela.
5 “La Ley 7/2011, de 27 de octubre, del turismo de Galicia, enumera en su artículo 55 los
tipos de establecimientos de alojamiento turístico, entre los que se encuentran los aparta-
mentos y viviendas turísticas. Su denición viene recogida en los artículos 64 y 65 de la
ley, remitiendo a un posterior desarrollo reglamentario lo referente a los requisitos y a las
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lecimentos de alojamento turístico, entre apartamentos e casas de turismo.
Os artigos 64 e 65 estabelecem a regulação sobre os requisitos e as condições
operacionais.
Os problemas mais relevantes relacionados a essa atividade são diversos,
tais como impacto econômico-social, scalização e tributação, garantia e se-
gurança dos usuários, qualidade do fornecimento e satisfação dos usuários,
inconvenientes causados a residentes e cidadãos, intrusão e concorrência
desleal, entre outros. Dessa forma, o ponto de partida no regulamento desse
número está localizado na Lei n° 4/2013, de 4 de junho, sobre medidas de
exibilidade e promoção do mercado de aluguel de casas, que incorporaram
uma exclusão adicional ao escopo de aplicação da Lei n° 29/1994, de 24 de
novembro, de arrendamentos urbanos, as chamadas casas de uso turístico, re-
ferindo-as a uma regulamentação do setor turístico, de competência exclusiva
das comunidades autônomas (JUNTA DE GALÍCIA, 2017).
Nesse ponto, as organizações das habitações para o uso do turismo na Galí-
cia se orientam pela Lei nº 12/2014, de 22 de dezembro, sobre medidas scais
e administrativas (DOG nº 249, de 30 de dezembro), além de ter sido adicio-
nado um novo artigo à Lei nº 7/2011, artigo 65 bis, que introduz essa nova
tipologia de acomodações turísticas. Já o Decreto nº 52/2011, de 24 de março,
estabeleceu o arranjo de apartamentos e casas turísticas, em desenvolvimento
da Lei nº 14/2008, de 3 de dezembro, sobre turismo na Galícia, modicado
pela Lei 1/2010, de 11 de fevereiro, que altera várias leis na Galícia para adap-
tá-las à Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12
de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno.
Com a entrada em vigor da Lei nº 7/2011, de 27 de outubro, foi necessário
modicar o Decreto 52/2011, para adequá-lo às disposições legais. Assim,
esse decreto, além de regular apartamentos e residências turísticas, introduz
a regulamentação das habitações turísticas, que completa a integração dessa
gura nos regulamentos do setor de turismo de nossa comunidade autônoma
(JUNTA DE GALÍCIA, 2017)
6
.
condiciones de funcionamiento. Las problemáticas más relevantes vinculadas a esta acti-
vidad son de diversa índole, impacto económico-social, scalidad y tributación, garantía
y seguridad de las personas usuarias, calidad de la oferta y satisfacción de las personas
usuarias, molestias causadas a los residentes y a la ciudadanía, intrusismo y competencia
desleal, entre otras. El punto de partida en la regulación de esta gura se sitúa en la Ley
4/2013, de 4 de junio, de medidas de exibilización y fomento del mercado de alquiler de
viviendas, que incorporó una exclusión más al ámbito de aplicación de la Ley 29/1994,
de 24 de noviembre, de arrendamientos urbanos, las denominadas viviendas de uso tu-
rístico, remitiéndolas a una reglamentación sectorial turística, que es una competencia
exclusiva de las comunidades autónomas”.
6 “En esta línea, y a n de proceder a la ordenación de las viviendas de uso turístico en
Galicia, mediante la Ley 12/2014, de 22 de diciembre, de medidas scales y administra-
tivas (DOG núm. 249, de 30 de diciembre), se añadió un nuevo artículo a la Ley 7/2011,
el artículo 65 bis, que introduce esta nueva tipología de alojamiento turístico. El Decreto
52/2011, de 24 de marzo, establecía la ordenación de apartamentos y viviendas turísticas,
en desarrollo de la Ley 14/2008, de 3 de diciembre, de turismo de Galicia, modicada
por la Ley 1/2010, de 11 de febrero, de modicación de diversas leyes de Galicia para su
adaptación a la Directiva 2006/123/CE, del Parlamento Europeo y del Consejo, de 12 de
diciembre de 2006, relativa a los servicios en el mercado interior. Con la entrada en vigor
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SuStentabilidade e políticaS públicaS de combate a deSpopulação rural no braSil e
eSpanha: reflexõeS neceSSáriaS
2. DESAFIOS E PERSPECTIVAS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
RURAIS NO BRASIL
No Brasil e em outros países, segundo o Ministério do Turismo (2020, p.
9-10), a prática do turismo pode proporcionar alguns benefícios, tais como
[a] diversicação da economia regional, pelo estabelecimento de micro e
pequenos negócios; a melhoria das condições de vida das famílias rurais; a
interiorização do turismo; a difusão de conhecimentos e técnicas das ciên-
cias agrárias; a diversicação da oferta turística; a diminuição do êxodo rural;
a promoção de intercâmbio cultural; a conservação dos recursos naturais; o
reencontro dos cidadãos com suas origens rurais e com a natureza; a geração
de novas oportunidades de trabalho; a melhoria da infra-estrutura de trans-
porte, comunicação e saneamento; a criação de receitas alternativas que valo-
rizam as atividades rurais; a melhoria dos equipamentos e dos bens imóveis;
a integração do campo com a cidade; a agregação de valor ao produto primá-
rio por meio da verticalização da produção; a promoção da imagem e revigo-
ramento do interior; a integração das propriedades rurais e comunidade; a
valorização das práticas rurais, tanto sociais quanto de trabalho; o resgate da
auto-estima do campesino.
O Ministério dene o Turismo Rural como o “conjunto de atividades tu-
rísticas desenvolvidas no meio rural, comprometido com a produção agro-
pecuária, agregando valor a produtos e serviços, resgatando e promovendo
o patrimônio cultural e natural da comunidade” (BRASIL, MINISTÉRIO DO
TURISMO, 2020, p. 11). Por isso, no Brasil, para que o turismo rural seja im-
plementado, existe a necessidade de iniciativas entre o setor público e priva-
do, a m de buscarem a melhor forma de articulação envolvendo a comuni-
dade e trazendo a infraestrutura para tal prática.
Contudo, no caso brasileiro, o país enfrenta não somente problemas am-
bientais, mas também a desigualdade social, a qual é extrema e aumenta cons-
tantemente. Segundo o Governo Federal, o Brasil é um dos exportadores de
produtos agrícolas e, com isso, observa-se que “no ano agrícola 2018/2019, a
subvenção total alocada para o crédito rural (na forma de equalização de ta-
xas e juros) foi de R$ 10,03 bilhões, dos quais R$ 5,65 bilhões, ou 56,3%, foram
destinados à agricultura empresarial, sendo o restante destinado à agricultura
familiar”. Dessa forma, parte dos agricultores puderam ter acesso a nancia-
mentos através do crédito agrícola.
Já para o ano agrícola 2019/2020, ocorreu “mudança nessa proporção e a
agricultura familiar deve ser contemplada com mais da metade da subvenção
total (mais precisamente 50,5%)” (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 1). Também
em 2019, surgiu a Medida Provisória nº 897, de 01/10/2019 denominada MP
do Agro, que busca estratégia de dotar o setor produtivo rural de instrumen-
de la Ley 7/2011, de 27 de octubre, se hacía necesario modicar el citado Decreto 52/2011,
para su adaptación a lo dispuesto legalmente. Así, este decreto, además de regular los
apartamentos y viviendas turísticas, introduce la regulación de las viviendas de uso turís-
tico, con el que se completa la integración de esta gura en la normativa sectorial turística
de nuestra comunidad autónoma. Este decreto consta de cuarenta y cinco artículos estruc-
turados en cinco capítulos, tres disposiciones adicionales, dos disposiciones transitorias,
una disposición derogatoria y dos disposiciones nales”.
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tos de mercado para que se possa obter, paulatinamente, a redução no dire-
cionamento de crédito voltado ao setor, bem como a melhoria na focalização
da subvenção restante, uma vez que a agricultura empresarial seria coberta
por esses instrumentos privados (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 1).
Tem-se também o Fundo de Aval Fraterno (FAF), constituído de emprés-
timos solidários, o qual está presente em cooperativas denominadas Luzzati,
na Itália, e nas Sociedades Garantidoras Rurais, na Espanha, cujo objetivo é
proporcionar garantias acessórias, “providas pelos próprios produtores na
forma de aval coletivo e solidário, assim como por outros integrantes das ca-
deias produtivas (fornecedores de insumos, beneciadores, instituições nan-
ceiras etc.)” (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 3). O Governo Federal também
faz alusão ao Regime de Afetação de Imóveis Rurais e Cédula Imobiliária
Rural (CIR), que permitem aos produtores rurais usufruírem seus imóveis,
sendo que essa “proposta de criação do regime de afetação do imóvel rural e
de lançamento da CIR vem para viabilizar a repartição do imóvel rural com
menores custos, de modo a dirimir o problema das garantias excessivas a cus-
to compatível para o produtor” (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 5). Portanto,
a CIR acaba sendo um título de crédito nominativo, transferível e de livre
negociação, além de ser uma
[...] representativa de promessa de pagamento em dinheiro, deco-
rrente de operação de crédito, de qualquer modalidade, contratada
com instituição nanceira, bem como obrigação de entregar, em
favor do credor, bem imóvel rural ou fração deste vinculado ao
patrimônio de afetação, o qual serve de garantia à operação” (GO-
VERNO FEDERAL, 2019, p. 5).
Existem também nanciamentos do setor agropecuário provenientes do
crédito rural direcionado, visto que além dos
[...] recursos obrigatórios advindos dos depósitos à vista (30%) e
da Poupança Rural (60%), existem ainda recursos provenientes dos
Fundos Constitucionais de Desenvolvimento (FCO, FNE e FNO),
do FUNCAFE e do BNDES. Essas fontes direcionadas pressionam a
oferta de crédito e aumentam as taxas de juros cobradas no crédito
livre (não direcionado) (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 6).
Já o aprimoramento da Cédula de Produto Rural (CPR), criado pela Lei nº
8.929/1994, é um “título de crédito líquido e certo, representativo de promes-
sa de entrega de produtos rurais e subprodutos, de emissão exclusiva dos
produtores rurais, suas associações e cooperativas” (GOVERNO FEDERAL,
2019, p. 7). Também existem os títulos do agronegócio, criados pela Lei nº
11.076/2004, emitidos pelos agentes econômicos intervenientes em diferentes
estágios da cadeia do agronegócio (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 8).
A MP agro traz também a escrituração dos títulos de crédito, medidas para
melhorar a alocação de recursos e a concorrência no crédito rural, extensão da
equalização de taxas de juros para todos os agentes nanceiros que operam
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SuStentabilidade e políticaS públicaS de combate a deSpopulação rural no braSil e
eSpanha: reflexõeS neceSSáriaS
no segmento de crédito rural e a possibilidade de subvenção econômica para
construção de armazéns por cerealistas (GOVERNO FEDERAL, 2019, p. 9-12).
Segundo o Ministério da Agricultura (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA,
PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, 2018, p. 10), entre os anos de 2018 e 2019,
as principais medidas adotadas foram: “(i) aumento na disponibilidade de
recursos e melhoria nas condições de nanciamento para diferentes nali-
dades e beneciários, (ii) ajustes nas normas operacionais do crédito rural”;
além dessas, a terceira medida diz respeito à “adoção de metodologias de
cálculo das taxas de juros do crédito rural, pré e pós xadas, a serem objeto
de escolha pelo tomador do crédito”. Desse modo, “essas metodologias não
se aplicam aos recursos oriundos dos Fundos Constitucionais e da Poupança
Rural Equalizada”.
Em relação a isso, de acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento (2018, p. 10-17), tem-se as seguintes formas de auxílio ao
crédito rural: Programa de Modernização da Agricultura e Conservação dos
Recursos Naturais (Moderagro); Programa de Desenvolvimento Cooperativo
para Agregação de Valor à Produção Agropecuária (Prodecoop); Programa
para Redução da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (Progra-
ma ABC); Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção Agro-
pecuária (Inovagro); Programa para Construção e Ampliação de Armazéns
(PCA); Investimento Pecuário com Recursos Obrigatórios do Crédito Rural.
Além de todos os programas supracitados, existe o FUNCAFÉ, o qual con-
siste em medidas de incentivo ao setor cafeeiro. Também há um programa de
apoio à gestão de riscos rurais, o qual o Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento (MAPA) “vem aperfeiçoando, destacam-se o Zoneamento
Agrícola de Risco Climático e o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro
Rural”.
Tem-se aqui o Seguro Rural e o Programa de Subvenção ao Prêmio do Se-
guro Rural (PSR), instituído pela Lei nº 10.823, de 19 de dezembro de 2003, e
pelo Decreto nº 5.121, de 30 de junho de 2004. Além deles, há o Zoneamento
Agrícola de Risco Climático (ZARC) e o Programa de Subvenção ao Prêmio
do Seguro Rural (PSR) (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E
ABASTECIMENTO, 2018, p. 26).
Segundo a Embrapa (2018, p. 30), “projeta-se que, em 2025, os países em
desenvolvimento serão responsáveis por 96% do consumo adicional de grãos
e 88% de produtos de origem animal”. Contudo, a pobreza rural continua
intensa e são necessárias políticas públicas para a minimização do problema,
sendo que a Embrapa destaca uma parcela das populações indígenas e comu-
nidades tradicionais extrativistas “que são usuárias e ‘guardiãs’ de parcela
substancial de áreas de conservação de uso sustentável no bioma Amazônia e
que estão inseridas nas classes de extrema pobreza e de pobreza no meio rural
brasileiro” (2018, p. 56). Ainda de acordo com dados da Embrapa,
[...] apenas o desenvolvimento de tecnologias adequadas às dife-
rentes condições socioeconômicas e ambientais não será a solução,
uma vez que esses produtores apresentam baixo nível de escolari-
dade e carecem de acesso à assistência técnica e extensão rural, o
que diculta ou até impossibilita a incorporação de tecnologias já
200
Cleide Calgaro/riCardo Hermany
existentes. É importante facilitar o processo de tomada de decisão
dos pequenos produtores com relação ao que se deve produzir e
como essa produção será realizada, provendo informações e auxi-
liando na construção de sistemas de produção ajustados à realida-
de dos estabelecimentos. Em grande parte dos casos, as políticas
de transferência de renda têm papel fundamental na manutenção
dessas famílias (Rocha, 2013; Skouas et al., 2017), até que soluções
adequadas e permanentes sejam viabilizadas para promover a au-
tonomia econômica e o bem-estar dessas populações (EMBRAPA,
2018, p. 56-57).
Em 2015, o Brasil assinou a Conferência das Nações Unidas sobre as Mu-
danças Climáticas de 2015 - COP21 para a redução de emissões de GEE no ar-
gumento do desenvolvimento sustentável, cuja ideia era “o fortalecimento do
Código Florestal, a promoção do desmatamento ilegal zero, o reorestamento
de 12 milhões de hectares e o alcance de participação estimada de 45% de
energias renováveis na composição da matriz energética” (EMBRAPA, 2018,
p. 67-68).
Além desses acordos, foi assinado o Acordo de Paris, no qual se “destacam
o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNC) (2016), aprova-
do pelo Brasil em 2016, e o Plano ABC”. Também foi assinado o Protocolo
de Quioto, negociado no Japão em 1997 e executado a partir de 2005, o qual
estabelece metas internacionais de redução de emissões e está vinculado à
UNFCCC.
O Brasil é parte contratante da CDB desde 1994 (EMBRAPA, 2018, p. 68).
¿Mas de que forma se implementam esses acordos internacionais para que
haja uma agricultura e pecuária sustentáveis? ¿Como intensicar o sistema
agrícola e minimizar os impactos socioambientais? Essas questões necessi-
tam de respostas para que se possa minimizar os problemas socioambientais
apresentados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa apresentou como objetivo geral o de destacar que a Espanha
vem adotando uma série de medidas estratégicas para a busca da sustentabi-
lidade, visto que é fundamental a busca do direito à sustentabilidade aos pro-
dutores agrícolas, incluindo a gestão social, econômica e ambiental. Assim,
ressaltou-se a gama de políticas públicas utilizadas na Espanha e no Brasil, a
m de garantir que haja uma agricultura pautada na sustentabilidade. Nes-
se sentido, questionou-se: ¿como o direito à sustentabilidade e suas políticas
públicas podem contribuir para o combate a despopulação rural no Brasil e
na Espanha?
Desta forma, visando responder ao problema proposto utilizou-se os méto-
dos de abordagem dedutivo e de procedimento hermenêutico, além da técnica
de pesquisa bibliográca. O trabalho foi dividido em dois objetivos especí-
cos, sendo que o primeiro buscou analisar a sustentabilidade agrícola em suas
múltiplas dimensões, traçando um paralelo com a experiência espanhola.
201
SuStentabilidade e políticaS públicaS de combate a deSpopulação rural no braSil e
eSpanha: reflexõeS neceSSáriaS
Neste ponto, evidenciou-se que uma importante alternativa para se anali-
sar a múltipla sustentabilidade é a partir do turismo rural - no caso da Espan-
ha, o que pode ser igualmente fortalecido no Brasil - o qual poderia ser um
caminho para criar políticas públicas que minimizem o problema da despo-
pulação rural. Destacou-se que na Espanha, existem diversas normativas que
regulamentam a temática, a Lei nº 7, de 27 de outubro de 2011, estabelece as
diretrizes para o turismo rural, a qual prevê os tipos de estabelecimentos de
alojamento turístico, entre apartamentos e casas de turismo, a regulação sobre
os requisitos e as condições operacionais.
Ademais, ressaltou-se que os problemas mais relevantes relacionados a
essa atividade são diversos, tais como impacto econômico-social, scalização
e tributação, garantia e segurança dos usuários, qualidade do fornecimento e
satisfação dos usuários, inconvenientes causados a residentes e cidadãos, in-
trusão e concorrência desleal, entre outros, estão localizados na Lei n° 4/2013,
de 4 de junho. Outra normativa importante é a que trata sobre as organizações
das habitações para o uso do turismo na Galícia, nos termos da Lei nº 12/2014,
de 22 de dezembro, sobre medidas scais e administrativas (DOG nº 249, de
30 de dezembro), além de adicionar um novo artigo à Lei nº 7/2011, artigo 65
bis, que introduz essa nova tipologia de acomodações turísticas.
Frisou-se que o Decreto nº 52/2011, de 24 de março, estabeleceu o arranjo
de apartamentos e casas turísticas, em desenvolvimento da Lei nº 14/2008,
de 3 de dezembro, sobre turismo na Galicia, modicado pela Lei 1/2010, de
11 de fevereiro, que altera várias leis na Galícia para adaptá-las à Diretiva
2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de
2006, relativa aos serviços no mercado interno.
De outra forma, observou-se que no Brasil, para que o turismo rural seja
implementado, existe a necessidade de iniciativas entre o setor público e pri-
vado, a m de buscarem a melhor forma de articulação envolvendo a comu-
nidade e trazendo a infraestrutura para tal prática. No entanto, notou-se que
o país enfrenta não somente problemas ambientais, mas também a desigual-
dade social, a qual é extrema e aumenta constantemente.
É importante mencionar que, de acordo com o Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento, existem as seguintes formas de auxílio ao crédito
rural: Programa de Modernização da Agricultura e Conservação dos Recursos
Naturais (Moderagro); Programa de Desenvolvimento Cooperativo para
Agregação de Valor à Produção Agropecuária (Prodecoop); Programa para
Redução da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (Programa ABC);
Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção Agropecuária
(Inovagro); Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA);
Investimento Pecuário com Recursos Obrigatórios do Crédito Rural, dentre
outros.
Portanto, evidenciou-se que na Espanha as políticas públicas de combate
a despopulação estão relacionadas ao setor do turismo, tendo em vista que
existem diversas normativas que regulamentam o setor. Já no caso brasileiro,
as política públicas estão relacionadas a programas de incentivo à produção
rural, visando o desenvolvimento sustentável da zona rural.
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Cleide Calgaro/riCardo Hermany
REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério do Turismo. Secretaria de Políticas de Turismo. Diretrizes
para o desenvolvimento do turismo rural Brasil. Disponível em: http://
www.turismo.gov.br/sites/default/turismo/o_ministerio/publica-
coes/downloads_publicacoes/Diretrizes_Desenvolvimento_Turismo_
Rural.pdf. Acesso em: 02 jun. 2020.
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