Movimento multicultural dos direitos humanos: cinema brasileiro de retomada e formação do sujeito de direito - Los 70 años del CEDH y los 20 años de la Carta de Niza - Libros y Revistas - VLEX 1023424403

Movimento multicultural dos direitos humanos: cinema brasileiro de retomada e formação do sujeito de direito

AutorSamene Batista Pereira Santana, Adriana Fresquet y Sheila Marta Carregosa Rocha
Cargo del AutorUniversidade Estadual da Bahia/ Faculdade independente do Nordeste/ Faculdades Santo Agostinho - Brasil / Universidade Federal do Rio de Janeiro - Argentina/Brasil / Universidade Estadual da Bahia - Brasil
Páginas363-379
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MOVIMENTO MULTICULTURAL DOS DIREITOS HUMANOS: CINEMABRAS ILEIRO...
MOVIMENTO MULTICULTURAL DOS DIREITOS
HUMANOS: CINEMA BRASILEIRO DE RETOMADA E
FORMAÇÃO DO SUJEITO DE DIREITO
SAMENE BATISTA PEREIRA SANTANA
(Universidade Estadual da Bahia/ Faculdade independente do Nordeste/
Faculdades Santo Agostinho - Brasil)
ADRIANA FRESQUET
(Universidade Federal do Rio de Ja neiro - Argentina/Brasil)
SHEILA MARTA CARREGOSA ROCHA
(Universidade Estadual da Bahia - Brasil)
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como escopo identificar as relações entre a con cepção
multicultu ral dos Direitos Humanos e a enunc iação audiovisual no Cin ema de
retomada no Brasil. Por meio de uma aná lise fílmica e bibliográfica percebemos, no
trabalho, que o discurso jurídico se destaca nas diversas narrativas audiovisuais
brasileiras, sobretudo no que diz respeito aos problemas de efetivação dos direitos
humanos. Para tanto, objetivamos analisa r os regimes d e visualidade - as condições
históricas, técnicas e estéticas de existência de alguns filmes representa tivos do s
anos 1990 - 2010 - e os processos de enunciação ou discursiviz ação d os direi tos
humanos na s narrativas, as quai s p ossuem cenários de so lidariedade, lu ta por
cidadania e sociabilidade de um lado, e, de outro, exclusão s ocial, violência e plu-
ralismo jurídico.
Para ta nto, toma mos como obj eto empíri co as narr ativas de t rês longa s
metragem: Cidade de Deus (2002), Ônibus 174 (2002) e Notícias de uma guerra
particular (1999). Tais filmes foram selecionados a partir de um recor te do corpus
fílmico da tese de doutorado intitulada: Campo de memória e regimes de visualidade
da violê ncia, apresen tada no ano de 201 9 ao programa d e p ós graduação e m
Memória: Linguagem e Socieda de, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia/
Brasil, cuja seleção priorizou produções da era de retomada com maior visibilidade
e relevância mercadológica. Desta forma, o presente ensaio reconhece a importância
de outros filmes que marca ram a discursividade em torno d as questões relativas às
identidades brasileiras.
Como exemplo, os anos entre 1955 e 1970, no Brasil, fora m ma rcados por
diversas manifestações que se opunham ao mercado artístico internacional. Nesse
período, o Brasil vivenciou um momento único na música, nas artes plástic as e
principalmente no cinema. Quando Nelson Pereira dos Santos produziu o filme Rio
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SAMENE BATISTA PEREIRA SANTANA / ADRIANA FRESQUET / SHEILA MARTA CARREGOSA R.
40 Graus (1955), começava um ciclo de produções cinematográficas contrárias às
produções nacionais que tinham no cinema hollywoodiano, em especial, um ideal
de cinematografia. Os cineastas dessa nova fase do cinema brasileiro faziam seu
cinema gozando de uma maior liberdade criativa e improvisação nas produções,
marcando, assim, o futuro do Cinema Novo. Há, inclusive, um gr ande mérito em
Rio 40 graus, no momento em que enuncia, com muita leveza, a desigualdade social
e a formação de espaços periféricos numa chave de solidariedade e construção de
cidadania1. Outros exemplos, contempor âneos à retomada, estão nos filmes da
«trilogia» da cineasta Maria Augusta Ramos: Justiça (2004), Juízo (2007) e O Process o
(2018), que também foram de grande importância na consolidação de narrativas
identitári as: definidas neste traba lho como o cinema que identifica a cultura , a
formação social , e os problemas socioeconômicos em determinado contexto históri-
co, tendo como base as rela ções de saber-poder entre Esta do jurisdicional e os
sujeitos envolvidos no processo judicial.
A partir deste recorte, enfatizamos que o Cinema da Retomada não diz respeito
a uma nova proposta estética para o cinema brasileiro, nem mesmo se refere a um
movimento organizado de cineastas em torno de um projeto coletivo. O Cinema da
Retomada se refere a um ciclo da h istória do cinema brasileiro, surgido graças a
novas condições de produção que se apresentaram a partir da década de 90 do
século XX, condições essas viabilizadas por meio de uma política cultural bas eada
em incentivos fiscais para os investimentos no cinema. A elaboração dessa política
cinematográfica alterou as relações entre os cineastas , e, simultaneamente, exigiu
novas formas de relacionamento d esses com o Estado, seu principal interlocutor.
Desta forma, trabal hamos neste ensaio sob dois eixos teóri cos-metodológicos: o
cinema brasileiro de retomada e sua importância na formação de discursividades
sobre os sujeitos de dire ito, bem como o mo vimento multicultural dos Dire itos
humanos a partir da enunciação fílmica.
Compreendemos, em primeiro lugar, que o Direito está atravessado por ficções,
apesar de inúmeras teses jurídicas associando-o exclusivamente ao plano da realidade.
Na esfera da teo ria narrativist a d o D ireito, Calvo Gonzá lez afirma que nossos
sistemas jurídicos são instalações ficcionais e, por vezes, hiperficcionais: «o direito
é uma forma linguística ficcional de um mundo puramente textual. Ele habita nos
discursos narrativos e, portanto, não está imune aos efeitos da ficcionalidade» 2.
Em segundo lugar, para além da nar ratividade linguística e literária, o presen-
te artigo tem como objetivo secundário mostrar um direito como práxis audiovisual.
A audi ovisual idade pos sibilit a uma inve stigaçã o prática d os senti dos, core s,
forma tos, silen ciamento s, aconteci mentos e exp ressões do d ireito. E p or isso,
pergu ntamos: como o s ujeito de dire ito se consti tui por meio da im agem em
movimento? Como os regimes de visualidade engendram uma relação de enunciação
sobre os Direitos Humanos no Brasil e no mundo?
Parti mos então da pr emissa de que no Brasil, os f undamento s da Carta
Constituinte da República Federativa estão fincados, historicamente, nos processos
de redemocratização pós ditadura militar, bem como após a 2ª guerra mundial, que
redefiniu as diretrizes dos Direitos Humanos em todo o mundo. Nasce assim, o
princípio da dignid ade da pessoa humana (inciso III do art. 1º da Constituição
1S. LEITE, Cinema brasileiro: das origens à retomada, São Paulo, 2005.
2J. C. GONZÁLEZ, Direito Curvo, Porto Alegre, 2013, p. 52.

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