Sustentabilidade e condicoes de vida em areas urbanas: medidas e determinantes em duas regioes metropolitanas brasileiras **. - Vol. 32 Núm. 96, Agosto 2006 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 55812859

Sustentabilidade e condicoes de vida em areas urbanas: medidas e determinantes em duas regioes metropolitanas brasileiras **.

AutorMoreira Braga, T
CargoTema central

Abstract

This paper develops ah Urban Sustainability Index System as part of a broader effort to provide better quality data and statistical analysis for local environmental decision-making. We show that urban sustainability can be measured in a comprehensive and synthetic way. In providing fair comparison across cities while keeping sensibility to local context, this index system can be used by policy-makers as a powerful tool to identify critical trends and policy gaps. This Urban Sustainability Index System has been applied to 57 cities in the Metropolitan areas of Sao Paulo and Belo Horizonte, Brazil. The results indicate two different paths in relation to sustainability. The first is characterized by a gap between environmental quality and human development, leading away from sustainability. It is followed by the core cities and highly industrialized ones in both metropolitan areas. The second leads toward sustainability and is followed by a heterogeneous group of cities in both regions.

Key words: urban sustainability, sustainability index, Sao Paulo metropolitan area, Belo Horizonte metropolitan area.

Resumo

Este artigo é parte de um esforço acadêmico recente de criaçao de ferramentas de mensuraçao do fenômeno sustentabilidade. Apresenta sistema de índices de sustentabilidade urbana, aplicando-o a 57 municípios das Regioes Metropolitanas de Sao Paulo e Belo Horizonte, Brasil. O sistema de índices foi criado considerando, principalmente, très fatores: a) incorporaçao das dimensoes economica, ecológica, politico-social, espacial (ou territorial) e de planejamento; b) adoçao da escala urbana/metropolitana; e c) incorporaçao de indicadores institucionais capazes de avaliar a capacidade do sistema político e da sociedade em oferecer respostas aos desafios presentes e futuros da sustentabilidade. Os resultados obtidos mostram a existência de dois padroes claros nas duas regioes. O primeiro, de desequilíbrio entre qualidade ambiental e desenvolvimento humano, verificado no município central e nos municípios fortemente industrializados de ambas as regioes. O segundo, mais sustentável, de equilíbrio entre qualidade ambiental e desenvolvimento humano, verificado em municípios com diferentes perfis em ambas as regioes.

Palavras-chave: sustentabilidade urbana, indicadores de sustentabilidade, Regiao Metropolitana de Sao Paulo, Regiao Metropolitana de Belo Horizonte.

  1. Sustentabilidade urbana: significado e medidas

    Aidéia de sustentabilidade urbana é uma ferramenta poderosa na aproximaçao das temáticas ambiental e urbana, a qual se consolidou ao longo da década de 90.

    A oposiçao entre o ambiental e o urbano, o primeiro visto como pertencente ao reino do natural e o segundo como a expressao do nao-natural, dominou o pensamento ambientalista em seus primórdios. Se nas raízes do ambientalismo e em suas vertentes preservacionista e conservacionista abre-se um enorme ponto cego em relaçao à questao urbana (Costa, 1995), a mudança de enfoque na definiçao da questao ambiental em direçao à sustentabilidade nos anos 80 permitiu uma aproximaçao das temáticas.

    Temas como desenvolvimento urbano, controle da poluiçao atmosférica e hídrica nas cidades, utilizaçao sustentável de recursos naturais e conservaçao de espaços verdes no interior dos espaços urbanos tiveram forte presença na agenda das principais organizaçoes multilaterais voltadas para o desenvolvimento e para a questao urbana nos anos 90, bem como em seus critérios para aprovaçao de projetos e concessao de financiamentos (UNCHS, 1988; The World Bank, 1991; United Nations, 1992; UNDP, 1992; UNDP/UNCHS/The World Bank, 1994).

    No caso das Conferências Internacionais, é sintomática a inclusao da questao ambiental no espaço urbano como um dos cinco grandes temas do Hábitat II (conferência internacional da ONU sobre as cidades), bem como a inclusao das temáticas cidades e poder local entre as principais questoes discutidos na Rio 92 (conferência internacional da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento) e sistematizados na Agenda 21.

    Recentemente, o Millennium Ecosystem Assessment, ou Avaliaçao Ecossistêmica do Milênio (1), incluiu o sistema urbano entre as 10 categorias de sistemas utilizadas para apresentar seus resultados (Millennium Ecosystem Assessment, 2005).

    A Agenda 21 Brasileira elegeu o tema cidades sustentáveis como um dos seis pilares sobre os quais se sustenta a construçao da sustentabilidade ambiental, social e econômica do país (Novaes, 2000).

    Como foi enunciado, a idéia de sustentabilidade urbana corporifica a convergência entre o ambiental e o urbano. Mas, a despeito da crescente importância e amplo uso do conceito, este está longe de possuir significado consensual. Segundo Ferreira (1998: 59), "o conceito torna-se um ponto de referência obrigatório dos debates acadêmicos, políticos e culturais; na verdade, passa a ser uma idéia poderosa, sobre a ordem social desejável e um campo de batalha simbólico sobre o significado desse ideal normativo".

    O que há subjacente às diversas versoes do que seria o desenvolvimento sustentável urbano é uma disputa pelo estabelecimento da "verdade" no que tange a esse conceito. Verdade entre aspas, pois esta nunca é absoluta, é sempre socialmente construída através de uma disputa de poder. Segundo Foucault (1996:13) os discursos em si nao sao verdadeiros ou falsos, o que existe é "um combate pela verdade [...] pelo conjunto das regras segundo as quais se distingue o verdadeiro do falso e se atribui ao verdadeiro efeitos específicos de poder". Para Bourdieu (1996: 127), "quando se trata do mundo social, as palavras criam as coisas, já que criam o consenso sobre a existência e o sentido das coisas, o senso comum". Nesse contexto, "se existe uma verdade, é que a verdade é um lugar de lutas".

    Ao aplicar esta discussao à questao da sustentabilidade urbana, Acselrad (1999) alerta que a forma pala qual se articulam conceitos e se constroem matrizes discursivas que articulam as questoes ambiental e urbana fazem parte de um jogo de poder em torno da apropriaçao do território e de seus recursos, que têm por objetivo legitimar ou deslegitimar discursos e práticas sociais. Partindo daí, o autor investiga os diversos discursos sobre a sustentabilidade urbana e identifica matrizes discursivas de representaçao de forma a tornar claro o que está sendo disputado, quais sao as visoes de futuro de cidade em disputa, o que se fazer durar, para quê e para quem, tornando transparentes as diferentes propostas políticas existentes por trás dos rótulos meio ambiente e sustentabilidade. Sao três as matrizes discursivas de sustentabilidade urbana identificadas pelo autor. A primeira, representaçao tecno-material da cidade, combina modelos de racionalidade energética com modelos de equilíbrio metabólico e reduz a sustentabilidade urbana a seu aspecto estritamente material. A segunda, representaçao da cidade como espaço da qualidade de vida, combina modelos de pureza, de cidadania e de patrimônio e remete a sustentabilidade a um processo de construçao de direitos que possam equacionar as externalidades negativas responsáveis pela insustentabilidade urbana. A terceira matriz, centrada na reconstituiçao da legitimidade das políticas urbanas, combina modelos de eficiência e eqüidade, além de remeter a sustentabilidade à construçáo de pactos políticos capazes de reproduzir suas próprias condiçoes de legitimidade.

    Compreender que a sustentabilidade urbana é antes uma idéia em construçao e disputa que uma definiçáo acabada, é fundamental para compreender o papel no estabelecimento de sua "verdade" dos esforços em torná-la mais operacional e mensurável, como a criaçao de indicadores. Portanto, é necessário explicitar aqui o que se entende por sustentabilidade ambiental.

    Eximimos-nos, contudo, de efetuar comparaçoes entre o conteúdo aqui atribuído à idéia de sustentabilidade urbana e outras definiçoes importantes no estabelecimento da "verdade" sobre o tema -como as provenientes da Agenda 21 (United Nations, 1992), do Habitat I (UNCHS, 1988), dentre outras-- uma vez que esta se tornaria por demais extensa no contexto deste artigo.

    Optamos por utilizar, dentre os vários conteúdos atribuídos à idéia de sustentabilidade urbana, uma que estivesse em consonância com a terceira das matrizes discursivas de sustentabilidade urbana identificadas por Acselrad (1999). Nossa escolha recaiu sobre a definiçao do Urban World Forum (2002), que define sustentabilidade urbana a partir do estabelecemineto de um conjunto de prioridades, sao elas: superar a pobreza, promover equidade, melhorar a segurança ambiental e prevenir a degradaçáo, estar atento à vitalidade cultural e ao capital social para fortalecer a cidadania e promover o engajamento cívico.

    A esta definiçao adicionamos as observaçoes feitas pro McGranahan e Satterthwaite (2002) e Miller e Small (2003) de que para ser considerada sustentável, nao é suficiente que uma cidade confira a seus habitantes condiçóes ambientais equilibradas, mas que o faça sem gerar externalidades negativas para outras regioes (próximas ou distantes) e para as geraçoes futuras. Isso implica em levar em conta náo apenas a escala local, ou intra-urbana, da sustentabilidade, mas também considerar a escala regional, constituída pela cidade e suas relaçoes com o entorno, e a escala global, constituída pelos seus impactos sobre os problemas ambientais globais, como o efeito estufa, e por questóes relativas aos impactos agregados da rede mundial de grandes cidades sobre o planeta.

    Apesar dos esforços recentes empreendidos na sistematizaçao de informaçoes para a gestáo ambiental urbana em cidades de diversos países e regióes, o desafio de lidar com a carência de informaçoes sistematizadas sobre a questao ambiental urbana ainda é de grande monta. Nao é por outra razao que grande parte das decisoes tomadas por órgaos públicos, na área ambiental, se dá a partir de informaçoes imprecisas que tornam-se "certezas" fragilmente construídas.

    Da...

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