Petroleo e porto no norte do estado do Rio de Janeiro, Brasil. - Vol. 46 Núm. 139, Septiembre 2020 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 863495854

Petroleo e porto no norte do estado do Rio de Janeiro, Brasil.

AutorCruz, Jose-Luis

Introducao

O Estado do Rio de Janeiro (ERJ) vem, desde meados da decada de 1990, revertendo um longo periodo de estagnacao e declinio economico, ocorridos da decada de 1970 a de 1990 (Oliveira, 2008, p. 47), quando chegou a perder, em alguns momentos, a segunda posicao no ranking dos estados mais ricos do pais--em termos do PIB--para o Estado de Minas Gerais. A transferencia da capital do pais do Rio de Janeiro para Brasilia, em 1961, e a crise economica dos anos 1980-1990, produziram um esvaziamento do parque industrial e o esgotamento da agricultura e da agroindustria tradicionais, punidas por seu baixo nivel de modernizacao. A economia fluminense manteve a sua concentracao na capital, Rio de Janeiro, e na Regiao Metropolitana (RMRJ). O parque industrial consistia, principalmente, na industria de base e de semi-industrializados, assim como de bens nao duraveis.

No entanto, ao final dos anos 1970 o ERJ iniciou a producao offshore de petroleo & gas, que veio a representar quase 90% da producao nacional de oleo, ate meados da primeira decada do seculo xxi. O estado tambem possui um dos tres maiores complexos petroquimicos do pais, na producao de petroquimicos basicos. Esse complexo foi criado em 1961 e a ele foi agregado um importante polo gas-quimico, e uma destacada industria naval. Esta teve um periodo de decadencia entre a decada de 80 ate 2007, quando foi recuperada por uma politica federal de encomendas para a industria petrolifera. Todavia, a industria naval encontra-se em crise novamente, desde 2015, dados os problemas enfrentados pela Petrobras, sua maior cliente, e devido tambem a retracao do mercado internacional de petroleo. A Petrobras, petrolifera estatal, detinha o monopolio da exploracao e producao, ate 1997, quando foi extinto por lei federal. A crise se deve, em parte, ao represamento dos precos domesticos dos combustiveis, desde 2011, inviabilizando o plano de investimentos 2012-2016, bem como as investigacoes de corrupcao na empresa, que afetaram seu programa de investimentos. A partir de 2008, iniciou-se a construcao do que seria o maior polo petroquimico do Brasil, o Complexo Petroquimico do Rio de Janeiro (Comperj), na RMRJ (Oliveira, 2008, p. 48). Sao eles os principais componentes da cadeia da industria petrolifera no ERJ.

A extracao petrolifera gerou rendas de elevadissima monta para o Estado e para uma dezena de municipios privilegiados, particularmente a partir de 1998. Mais recentemente, a partir da segunda metade da decada de 2000, um conjunto de Grandes Investimentos, espalhados por parte do seu territorio--principalmente no interior--foram postos em marcha, provocando profundas alteracoes nas configuracoes urbanas e urbano-regionais da dinamica espacial estadual. Os Grandes Investimentos, tratados aqui sob a sigla gi, sao investimentos publicos e privados de grande porte, em termos de capital, da area e do peso, em valores absolutos e relativos, no segmento a que estao ligados, e da capacidade de impacto no ambiente natural e construido. Esses investimentos podem ser tipificados como: i) de infraestrutura urbana: habitacao e saneamento, principalmente; ii) de infraestrutura economica: rodovias, ferrovias, portos e terminais portuarios, e aeroportos, principalmente; iii) industriais: complexo de extracao e producao de petroleo e gas (E&P); complexo petroquimico e gas-quimico; complexo metal-mecanico e siderurgico; complexo automotivo; e iv) turisticos: infraestrutura e equipamentos urbanos voltados para grandes eventos esportivos internacionais e entretenimento, na capital, Rio de Janeiro. Os investimentos dos tres primeiros grupos se dao majoritariamente no interior, fora do municipio da capital, e incluem municipios da RMRJ (Cruz, 2016).

Esses investimentos sao viabilizados, em sua maior parte, por recursos federais, isoladamente ou em parcerias com o capital privado, e se inscrevem na estrategia de insercao do Brasil na economia internacional. Essa insercao se da: pela consolidacao da producao agricola e agroindustrial para exportacao, com uma pauta variada; pelo fortalecimento da tradicional producao mineral; e pela producao de insumos e bens industriais intermediarios; e pela reestruturacao e nova rodada de expansao para a periferia, da industria automobilistica internacional. No periodo dos Governos do Partido dos Trabalhadores (PT), o pais chegou a figurar entre as seis maiores economias mundiais, tornando-se um dos maiores exportadores mundiais de produtos minerais e agroindustriais. O ERJ participou dessa estrategia como corredor de exportacoes de parte dessa pauta, e como produtor de aco e de petroleo.

A crise internacional de 2008 e a consequente desaceleracao da economia mundial atingiram o pais de forma mais dura, a partir de 2014, particularmente com a queda vertiginosa dos precos internacionais do barril de petroleo e com a desaceleracao no crescimento economico da China. Isso produziu fortes impactos na cadeia de fornecimento a esse segmento, bem como na demanda internacional pelas principais commodities da pauta de exportacoes. Ate entao, o Governo Federal implementara um conjunto de politicas anticiclicas, de corte keynesiano, que conseguiu manter estaveis o crescimento economico, o consumo, o emprego e a renda, atraves de estimulos ao credito popular, de aumentos reais do salario minimo, do Bolsa-Familia, de subsidios a segmentos empresariais e de encomendas de governo ao setor privado. O Programa de Aceleracao do Crescimento (PAC), e o Programa de Habitacao Minha Casa Minha Vida (PMCMV) sao exemplos.

A crise brasileira atingiu gravemente o ERJ, cuja economia tornara-se altamente dependente da industria do petroleo--cerca de 33%, em 2014, conforme declaracao do secretario estadual Julio Bueno, em 4/01/2015 (Associacao Comercial do Rio de Janeiro [ACRJ]), 2015)--e, particularmente, das suas rendas, concentradas no orcamento estadual e em uma duzia dos seus 92 municipios. Em entrevista ao jornal Valor, no dia 14/05/2015 (p. A14), o governador Pezao disse que, "incluindo estaleiros, fabrica de sonda, toda a cadeia produtiva representa 33% do PIB estadual" (Pessanha, 2015). Com 8,4% da populacao e 11,2% do PIB do pais, o ERJ recebia, em 2008, 75,4% das rendas petroliferas, que consistiam em royalties e participacoes especiais, referentes a um percentual adicional nos pocos mais rentaveis (Gobetti, 2011). Desde 2010, entretanto, a producao do petroleo extraido da camada do pre-sal vem deslocando o centro da producao para o litoral de Sao Paulo (SP), e parte do litoral do ERJ, diminuindo a participacao deste na producao e nas rendas. A partir de 2017 vem ocorrendo gradativa recuperacao dos precos internacionais, embora os pocos do Norte Fluminense (NF) estejam em estagio de maturacao, necessitando de investimentos para recuperarem os niveis de producao.

Mesmo antes de a crise mundial atingir o pais e, no caso particular aqui analisado, o ERJ, existe um debate acerca das opcoes nacionais de politicas e acoes voltadas para o crescimento economico, caracterizadas como constituintes de um modelo de reprimarizacao da economia, apoiado na exportacao de produtos primarios e semi-industrializados. A discussao extrapola as fronteiras nacionais e assume centralidade na discussao internacional sobre o desenvolvimento dos paises perifericos, emergentes, de baixa industrializacao, dependentes, ou subdesenvolvidos, nas atuais condicoes da reproducao ampliada do capital no nivel global. O dominio do capital financeiro especulativo e ficticio, que impoe politicas neoliberais, ainda mais concentradoras e centralizadoras, articuladas a restricoes dos direitos, da cidadania e da democracia. Capital e tecnologia se concentram cada vez mais e a escala de reproducao e crescentemente global. As consequencias geopoliticas se expressam no agravamento de tensoes localizadas, orientadas pelos interesses das maiores potencias internacionais por fontes de energia, materias primas e insumos estrategicos para a acumulacao capitalista, gerando enormes conflitos sociais, com deslocamentos forcados de populacoes.

A luz de tais reflexoes, este artigo analisa a dinamica economica recente do ERJ, sob a perspectiva do padrao de crescimento economico brasileiro, focando no processo em curso no norte do estado, atraves de dois Grandes Projetos de Investimento (GI) estrategicos para o padrao de integracao internacional da economia brasileira. Serao apontados os impactos socioespaciais, expressos principalmente na dinamica populacional, das rendas petroliferas e do mercado de trabalho, bem como serao identificados alguns conflitos dele decorrentes. Busca-se, com os casos analisados, contribuir para as reflexoes acerca das tendencias e implicacoes da participacao das economias perifericas na nova Divisao Internacional do Trabalho (DIT).

Sao eles o Complexo de Exploracao e Producao-E&p offshore de Petroleo e Gas da Bacia de Campos, e o Complexo Industrial e Portuario do Acu (CIPA), localizados na mesorregiao nf, onde se encontra a Bacia Petrolifera de Campos, num vetor territorial que desemboca na RMRJ (Cruz, 2016). Apesar da queda nos precos internacionais e da consequente crise dos orcamentos do estado e dos municipios fluminenses dependentes das rendas, a crescente exploracao e producao offshore na camada do pre-sal, em areas confrontantes com o Rio de Janeiro e outros quatro estados, devera colocar o pais entre os seis maiores em reserva e entre os maiores exportadores do mundo. O megaporto do Acu e um dos maiores do mundo, tendo suas atividades ancoradas no apoio as atividades de E&p de petroleo e gas offshore e na exportacao de minerio de ferro, do qual o Brasil e o maior exportador mundial. Conta com instalacoes para operar com conteineres e graneis solidos e liquidos, alem de possuir um Distrito Industrial (DI) anexo, fazendo parte da constituicao de um Complexo de Logistica Portuaria e Producao Industrial, embora esta ultima ainda esteja apenas na fase inicial. A figura 1 apresenta a...

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