A infraestrutura rodoviaria e a urbanizacao regional contemporanea no territorio paulista: o caso do corredor urbano Campinas-Sorocaba, Brasil. - Vol. 46 Núm. 138, Mayo 2020 - EURE-Revista Latinoamericana de Estudios Urbanos Regionales - Libros y Revistas - VLEX 870304168

A infraestrutura rodoviaria e a urbanizacao regional contemporanea no territorio paulista: o caso do corredor urbano Campinas-Sorocaba, Brasil.

AutorSantos, Wilson R., Jr.
CargoTexto en portugues

Introducao

As profundas transformacoes nas dinamicas de producao do espaco urbano associadas a reestruturacao em escala mundial do sistema capitalista a partir das ultimas decadas do seculo passado, constituiram-se como um novo marco conceitual que embasa grande parte das tematicas atuais nos campos do urbanismo e do planejamento urbano. Sob este novo paradigma constata-se, em diversas partes do mundo, a formacao de articulacoes urbanas em escala regional que estao estreitamente relacionadas a uma nova fase da dialetica territorial de dispersao-concentracao espacial das estruturas produtivas. Do ponto de vista da organizacao territorial, expressa uma mudanca no paradigma de polos regionais de industrializacao--conceito que impulsionou o desenvolvimento economico dos paises de industrializacao tardia ao longo da segunda metade do seculo XX--, para a constituicao de novos vetores inter-regionais de reconcentracao da atividade produtiva ao longo de vias de transporte regional de grande porte, mais atrativos ao recebimento de atividades economicas mais modernas.

E neste contexto que o presente artigo objetiva demonstrar a constituicao de um corredor urbano entre as regioes metropolitanas de Campinas e Sorocaba, conceituando-o como um dos vetores de maior intensidade de urbanizacao dentro em uma "macro-regiao urbanizada", a Megalopole do Sudeste (Queiroga, 2001), que envolve boa parte do territorio do Estado de Sao Paulo e partes dos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Adota uma abordagem estruturalista que, a partir da relacao entre as infraestruturas de transporte e os movimentos de dispersao urbana em escala regional, relaciona o fenomeno urbano empirico de dispersao e fragmentacao urbana em escala local/regional, aos processos de integracao da cadeia produtiva, em escala global. Destaca-se que este trabalho realiza uma abordagem metodologica especificamente sobre as transformacoes urbanas em escala regional, adequado a verificacao dos novos fenomenos urbanos dispersos que conformam a articulacao urbano-regional entre Campinas e Sorocaba.

O texto divide-se em quatro partes, alem da introducao e das consideracoes finais. As duas primeiras partes tratam de uma analise sobre o que se considera o momento de inflexao na dinamica de urbanizacao brasileira nas ultimas decadas do seculo XX, a crise do modelo de industrializacao por substituicao de importacoes e o fortalecimento da cadeia produtiva "flexivel"--fenomeno mais intenso em algumas regioes do que outras--tipica do atual periodo de globalizacao. Foca nos movimentos de concentracao e dispersao da urbanizacao associados a estes dois periodos da evolucao do sistema economico e da urbanizacao do territorio, brasileiro no geral, e paulista em particular.

Na terceira parte analisa-se propriamente a formacao do corredor urbano entre Campinas e Sorocaba, manifestado na constituicao de um eixo linear de intensa expansao urbana ao longo das ultimas duas decadas, conformando um continuum urbano entre cinco municipios ao longo da rodovia SP-75. Utiliza-se de analises morfologicas sobre a expansao urbana recente e sobre as mudancas nas tipologias urbanas predominantes, como metodologia para criar um quadro de caracterizacao atual da urbanizacao neste recorte territorial. Demonstra-se assim a tendencia a configuracao de um eixo linear de conurbacao ininterrupta entre as duas cidades a partir da implantacao de clusters industriais e empresariais, e de condominios e loteamentos residenciais fechados ao longo da rodovia SP-75, apoiados no potencial de circulacao e mobilidade regional proporcionados pela rodovia.

Na quarta e ultima parte, e analisado o papel das infraestruturas de transporte inter-regional na expansao urbana recente no eixo territorial entre Campinas e Sorocaba, relacionando a constituicao do corredor urbano Campinas-Sorocaba a concentracao de grandes volumes de investimentos estatais em infraestrutura de transporte e circulacao com o objetivo de ampliar a capacidade de fluxos de mercadorias em relacao tanto ao mercado consumidor local e nacional, quanto a cadeia produtiva internacional. Evidencia, portanto, que a formacao do corredor urbano esta associada a uma estrategia--por parte de diversos agentes que atuam sobre o territorio--de concentracao de atividade produtiva, especialmente de alta tecnologia, neste vetor territorial.

Formacao das primeiras metropoles nacionais durante o periodo de industrializacao por substituicao de importacoes

A partir de meados do seculo XX foram implementadas politicas de desenvolvimento economico e de integracao do mercado consumidor nacional que incidiram diretamente na formacao das primeiras metropoles nacionais em algumas capitais de estados brasileiros caracterizadas pelo vertiginoso processo de crescimento urbano e concentracao populacional em relacao ao restante do territorio brasileiro. Foi o periodo em que houve uma "explosao urbana" (Santos, 1994) nestas cidades, tracando as caracteristicas que viriam a marcar o desenvolvimento metropolitano no Brasil (e tambem no restante da America Latina, no geral); como a composicao de um tecido urbano denso e compacto ao redor de uma centralidade principal nucleadora da malha metropolitana; a clara divisao entre o "fim da cidade" e o espaco rural circundante a metropole; e as fortes desigualdades socioespaciais entre os espacos urbanos central e periferico, com o surgimento de grandes bolsoes de pobreza nas bordas das metropoles.

A politica de industrializacao no modelo de substituicao de importacoes vigorou como um dos principais programas politicos no Brasil entre as decadas de 1940 e 1960. Visava a criacao, por parte do Estado, de industrias de base--tambem denominadas como industrias de bens intermediarios, como siderurgicas e refinarias de petroleo, por sua condicao de fabricacao de produtos que servem de materia-prima para a producao e montagem de outras mercadorias industrializadas--em diversas regioes do pais, de forma a alimentar o crescimento da producao industrial manufatureira nacional e assim diminuir a dependencia de importacoes de produtos manufaturados externos. Neste contexto consolidou-se o padrao rodoviario de circulacao tanto no espaco intra-urbano quanto inter-regional, a partir do Plano de Metas criado durante o governo Juscelino Kubitschek em 1955, que promoveu a abertura da economia nacional aos investimentos estrangeiros e a implantacao da industria automobilistica no pais (Queiroga, 2001). Esta decisao politica deu inicio a uma simbiose que perdura ate a atualidade, no qual os investimentos em rodovias foram um dos fatores mais determinantes na expansao industrial (e justamente por Sao Paulo contar com melhores redes de transporte, tambem teve maior crescimento industrial e urbano), que por sua vez aumentava a demanda por expansao e melhorias de rodovias. As vantagens da concentracao demografica e de atividades industriais em determinados pontos do territorio eram evidentes neste periodo. Em um territorio entao com baixo nivel de desenvolvimento das estruturas produtivas capitalistas, a aglomeracao das forcas produtivas em um numero limitado de cidades criava as melhores condicoes possiveis para um rapido desenvolvimento industrial, propiciado pelas vantagens trazidas pelas "economias de aglomeracao". Assim as empresas de diferentes setores compartilhavam vantagens locacionais, tanto relacionadas a proximidade as fontes de materia-prima e aos principais mercados consumidores, concentracao de mao-de-obra, e as principais infraestruturas de transporte de mercadorias; quanto no desenvolvimento de uma cooperacao mutua que potencializavam suas respectivas capacidades produtivas (Benko, 1999).

A concentracao de investimentos industriais em algumas capitais reforcou a caracteristica historica de organizacao do territorio nacional enquanto um "grande arquipelago, formado por subespacos que evoluiram, segundo logicas proprias, ditadas em grande parte por suas relacoes com o mundo exterior" (Santos, 1994, p. 29). Os investimentos em infraestruturas de inducao da industrializacao (como a construcao de infraestruturas de transportes e comunicacao, e a criacao de universidades e institutos de pesquisa) ocorreram predominantemente de forma pontual nas imediacoes das cidades mais importantes no desenvolvimento economico nacional nos periodos anteriores, acentuando assim a concentracao demografica em algumas poucas areas urbanas do pais. Na pratica, induziu-se a constituicao de grandes metropoles industriais em meio a regioes de baixo desenvolvimento economico e social.

As metropoles industriais absorviam a grande massa populacional que se deslocava do campo para as cidades em busca de postos de trabalho ofertados pelo crescimento industrial, causando uma intensa corrente migratoria do campo a cidade. Segundo Santos (1994), o aumento do total de populacao urbana no Brasil foi de 653,03% entre 1940 e 1980, com um acrescimo medio de 111,53% entre as decadas de 1970 e 1980 e de 107,66% entre 1980 e 1990 (Santos, 1994). Contudo, a industrializacao brasileira nao se consolidou de forma a absorver toda mao-de-obra recem-chegada as cidades, causando o aumento da pobreza do desemprego nas metropoles industriais que, por sua vez, contrastavam com a riqueza gerada pelas industrias.

Desta forma consolidaram-se as caracteristicas mais marcantes das metropoles industriais que se estabeleceram na America Latina em meados do seculo XX. Foi o periodo que Lacerda (2012) classificou como o predominio de uma "urbanizacao polarizada", com a formacao de tecidos metropolitanos densos organizados em torno de uma centralidade que exercia forte poder nucleador das atividades economicas e da expansao urbana da cidade. Acentuava-se o contraste formado pela desigualdade socioespacial entre os bairros centrais concentradores de populacao e atividade comercial e de servicos de maior renda, e as extensas areas perifericas que recebiam a maior parte da populacao pobre que migrava...

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